Esses dias chegou-me um bilhete de um casal amigo. O bilhete dizia: -" O carinho é o mesmo, mas faz quinze anos que sumimos um do outro. Quando passar por aqui tire um dia em honra da nossa amizade que nunca diminuiu!" Telefonei e irei. Já têm três netos e eu nem sabia!
Já ganhei amigos que não merecia e perdi amigos que não desejaria ter perdido. Alguns, por culpa minha, outros por culpa deles. Eu fiz certo, mas eles acharam que não fiz. Em outros casos achei que fazia certo, mas fiz errado. Não me quiseram mais entre eles.
Tive amigos de infância que não prosseguiram como amigos de adolescência ou de juventude. Alguns de meus amigos de juventude não permaneceram comigo na idade adulta. Agora que chego quase aos setenta anos, percebo que muitos amigos de três a quatro décadas não mais me telefonam. Nem eu a eles. Algum laço se rompeu. E não foi nem inimizade. Parecemos continentes que se separaram com o movimento das placas tectônicas da vida.
Na verdade, poucas amizades duram a vida inteira. A maioria delas perde a impulso. Esses dias, encontrei dois velhos amigos de muitas décadas. Perguntamo-nos o que houve que não mais tivemos tempo nem de telefonar. Os dois lados não sabiam por quê. Um deles, americano, usou a palavra we drifted apart: boiamos para longe... Foi o que houve. As águas do tempo nos foram levando e esquecemos de remar contra a corrente para nos vermos mais vezes.
Amigos de longa data de repente foram embora e até hoje não sabemos por quê. Outros foram e quando nos vimos depois de 30 anos a amizade ainda era a mesma. Muitos de meus jovens precisaram da ausência para descobrir o que quanto fui importante na vida deles e eles na minha. Outros nunca perderam o contato. Colegas sacerdotes que conheço há cinqüenta anos permanecem grandes amigos, mesmo se faz dez que não nos vemos.
Isso de fazer e de perder amigos tem a ver com a atenção e o porquê. Às vezes ficamos desatentos e lá se vai o amigo. Às vezes ele perdoa. Ás vezes nós perdoamos os meses ou anos de telefonemas não dados. Há mais do que telefone nestes laços.
Há amigos pais, amigos filhos, amigos irmãos e amigos-amigos. Sem alguns, eu não saberia viver. Doeria demais. Nem eles vivem sem mim. Mas há outros cujo silêncio não doeu, mas nem por isso deixamos de nos querer bem. É mistério. Há amizades duradouras que nunca foram profundas. Há amizades profundas e duradouras. Há outras que duraram pouco. E há outras que não admitimos nem mesmo a hipótese de perder. Entraram na alma.
Uma coisa, porém, é certa. Trocar e substituir amigos, nunca! Não é porque arranjamos novos amigos que descartaremos os de ontem. O coração tem que ter lugar para outros mais. Amigo algum poderá ocupar o trono do outro, nem mesmo do que se foi e nos deixou sem uma palavra e um porquê. O lugar dele fica, à espera de sua volta, mesmo que nunca mais volte.
Isso de ser amigos é mistério. Nem Ágape, nem Eros nem Filia explicitam. É algo indefinível. Gostaríamos de não amar, mas amamos. E daí? Não os pedimos, mas vieram. Acho que Deus algo a ver com isso! Alguns amigos, por mais que briguemos foi Deus quem os deu. E dom de Deus a gente não desperdiça!
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